"(...) Chovia imenso e eu não conseguia adormecer. Levantei-me, fui até à cozinha e fiz um chá de gengibre e mel e juntei umas gotas de sumo de limão. Depois, sentei-me à mesa, a observar as gotas de chuva do outro lado das janelas. Aquele cenário, despido de força, encaixava-se num cenário aparentemente perfeito.
Deixei de ouvir o silêncio alguns minutos depois... ouvia, agora, uma voz suave lá de fora. Inclinei a cabeça para tentar perceber de onde vinha aquela voz. Aproximei-me da janela, abri-a um niquinho e apercebi-me que era a minha vizinha. Pensei que estaria ali, tal como eu a apreciar aquele momento de sossego. Apercebi-me, depois que estava a falar com a filha que vive nos Açores. Pude ouvir a voz tremer na despedida. Certamente, terá sido a primeira vez que não passa a Páscoa com a filha e os netos.
Voltei a sentar-me, terminei de beber o meu chá e regressei para o meu quarto. Deitei-me novamente e continuei a não conseguir adormecer. O tédio tinha-se apoderado de mim e não sabia mais o que fazer para me ocupar. Não pensar, não costuma resultar comigo... é algo que estou constantemente a fazer.
O ser humano é um animal social e quando estamos privados daquilo que consideramos ser normal, o tédio pode acabar por surgir e tornar-se aterrorizante.
Tentei desligar-me de tudo apenas por alguns minutos e coloquei uma música para me transportar dali para outro lugar qualquer. Ouvi In meinem Leben, da Nena. Sem dúvida, uma música que me consegue acalmar. Transmitiu-me aquilo que necessitava naquele momento - serenidade.
Voltei a ouvir o silêncio e fechei os olhos."
abril, 2020
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